Qual é a história que te move?
Texto originalmente publicado na Revista Panta-01
O que sempre vi de tragicômico em Dom Quixote hoje me parece absurdo, perigoso, talvez obsceno. Um homem isolado, buscando no mundo a realização de suas crenças, assumindo para si e impondo aos outros os riscos de sua empreitada.
Vi sair do livros e vir ao mundo essa pessoa que enxerga o que quer e age de acordo com as próprias fantasias. Ou melhor, age de acordo com as fantasias de outros, enxerga o mundo de outros e nem ao menos isso percebe. No Brasil o Quixote é uma massa, é uma força bruta.
Entretanto, o Quixote também está naqueles que têm em si o impulso de agir vivendo em um mundo que não existe. Quem vive mergulhado em barbárie só pode agir humanamente se vive em seu mundo particular, trazendo de lá o que pode.
Entre um extremo e outro, me parece que a lucidez é o que separa o Quixote monstro do Quixote idealista. É a capacidade ter freios, de ser crítico contra si mesmo e, antes de tudo, ser humano, pois uma pessoa é mais que a soma de seus atos ou de suas ideias.
É para alimentar os esperançosos e dar voz aos que pensam que surge a Revista Panta, um pequeno movimento de resistência, mas também de criação. Uma confluência de quem ousa sujar as mãos com o mundo tal como é e não como se espera que seja.
